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- Ele vem de uma democracia muito antiga, sabe...

- Você está querendo dizer que ele vem de um mundo de lagartos?

- Não - respondeu Ford que, àquelas alturas, já estava um pouco mais racional e coerente do que antes, tendo finalmente sido forçado a tomar uma xícara de café -, nada tão trivial. Nada assim tipo isso tão compreensível. No mundo dele, as pessoas são pessoas. Os líderes é que são lagartos. As pessoas odeiam os lagartos e os lagartos governam as pessoas.

- Ué - comentou Arthur -, achei que você tinha tido que era uma democracia.

- Eu disse - afirmou Ford. - E é.

- Então - quis saber Arthur, torcendo para não soar ridiculamente estúpido -, por que as pessoas não se livram dos lagartos?

- Isso sinceramente nunca passou pela cabeça delas - disse Ford. - Como elas têm direito de voto, acabam supondo que o governo que elegeram é mais ou menos parecido com o governo que querem.

- Quer dizer que eles realmente votam nos lagartos?

- Ah, sim - disse Ford, dando de ombros -, é claro.

- Mas - perguntou Arthur, sem medo de ser feliz - por quê?

- Porque, se deixam de votar em um lagarto - explicou Ford -, o lagarto errado pode assumir o poder. Você tem gim?

- O quê?

- Eu perguntei - disse Ford, com um tom crescente de impaciência entranhando-se em sua voz - se você tem gim.

- Vou ver. Conte-me sobre os lagartos.

Ford deu de ombros novamente.

- Algumas pessoas dizem que os lagartos são a melhor coisa que já lhes aconteceu - explicou ele. - Elas estão completamente enganadas, é claro, completa e absolutamente enganadas, mas é preciso que alguém tenha a coragem de dizer isso.

- Mas isso é terrível - disse Arthur.

- Olha, meu camarada - disse Ford -, se eu ganhasse um dólar altairiano cada vez que eu ouvisse um fragmento do Universo olhando para o outro fragmento do Universo e dizendo

"Isso é terrível", eu não estaria sentado aqui como um limão procurando por um gim. Mas não ganho e aqui estou. Enfim, por que você está assim todo sereno, com essa cara de babaca? Está

apaixonado?

Arthur disse serenamente que estava, sim.

- Com alguém que sabe onde está a garrafa de gim? E eu vou conhecê-la?

Conheceu, porque Fenchurch entrou naquele exato momento com a pilha de jornais que foi comprar na cidade. Hesitou diante dos destroços na mesa e dos destroços de Betelgeuse alojados no sofá.

- Onde está o gim? - Ford perguntou a Fenchurch. E, virando-se para Arthur: - O que aconteceu com a Trillian, por sinal?

- Hum, essa é Fenchurch - disse Arthur, completamente sem graça. - Não rolou nada com a Trillian, você deve ter visto ela por último.

- Ah, é - disse Ford -, ela se mandou com Zaphod para algum lugar. Tiveram filhos ou algo no gênero. Ou ao menos - acrescentou -, eu acho que eram filhos. Zaphod deu uma boa sossegada, sabe.

- Sério? - perguntou Arthur, ajudando Fenchurch com as compras.

- Sério - disse Ford. - Ao menos uma de suas cabeças agora está mais sã do que um avestruz que tenha tomado ácido.

- Arthur, quem é esse? - perguntou Fenchurch.

- Ford Prefect - respondeu ele. - Acho que já te falei dele por alto. capítulo 37

Durante três dias e três noites o gigantesco robô prateado prostrou-se profundamente perplexo sobre as ruínas de Knightsbridge, balançando-se levemente e tentando compreender um monte de coisas.

Delegações do governo foram examiná-lo e jornalistas alarmados surgiram aos borbotões, fazendo perguntas uns aos outros no ar, perguntando o que achavam daquilo. Alguns aviões militares tentaram um ataque patético, mas os lagartos não deram o ar de sua graça. O robô

vasculhava o horizonte, vagarosamente.

À noite, ele parecia ainda mais espetacular, iluminado pelas equipes de tevê que o filmavam continuamente enquanto ele continuamente não fazia nada. Ele pensou e pensou e finalmente chegou a uma conclusão.

Teria de enviar seus robôs de manutenção.

Devia ter pensado naquilo antes, mas estava preocupado com outras coisas. Os minúsculos robôs voadores surgiram chiando pela escotilha em uma tarde, em uma terrível nuvem de metal. Rondaram pelas áreas vizinhas, atacando freneticamente algumas coisas e defendendo outras.

Um deles finalmente encontrou uma loja de animais onde havia alguns lagartos, mas, ao defender a loja de animais em nome da democracia, agiu tão brutalmente que não sobrou pedra sobre pedra no lugar.

O momento crítico se deu quando uma divisão avançada de chiadores voadores descobriu o zoológico em Regent's Parle e mais especificamente, a jaula dos répteis. Com um pouco mais de cuidado, devido aos erros cometidos anteriormente no pet shop, as furadeiras e serras tico-tico voadoras conseguiram libertar as maiores e mais rechonchudas iguanas, levando-as até o robô prateado gigante, que tentou iniciar negociações de alto nível com elas.

Finalmente o robô anunciou ao mundo que, apesar de uma troca rica, franca e generosa de pontos de vista, as negociações de alto nível haviam falhado, os lagartos foram aposentados e ele, o robô, ia sair de férias em algum lugar. Por algum motivo acabou escolhendo Bournemouth.

Ford Prefect, vendo isso na tevê, balançou a cabeça, deu risadas e tomou outra cerveja. Tomaram providências imediatas para a sua partida.

Os kits de ferramenta voadores guincharam e serraram e furaram e fritaram coisas com luz durante um dia e uma noite e, na manhã seguinte, para a surpresa geral, um gigantesco suporte móvel começou a se dirigir para o oeste, em diversas pistas simultaneamente, com o robô sobre ele, alojado no suporte.

Dirigiu-se para o oeste, em um estranho carnaval, cercado por seus servos, por helicópteros e vans da imprensa, rasgando seu caminho até Bournemouth, onde o robô se desvencilhou lentamente das amarras do sistema de transporte e foi se deitar durante dez dias na praia.

Essa foi, de longe, a coisa mais incrível jamais acontecida em Bournemouth. Multidões reuniram-se diariamente ao longo de um perímetro que estava sendo vigiado e protegido como área de recreação do robô, tentando ver o que ele estava fazendo. Ele não estava fazendo nada. Estava deitado na areia. Estava deitado na areia de bruços, um pouco desajeitado.

Foi o jornalista de um periódico local que, tarde da noite, conseguiu fazer o que ninguém no mundo havia conseguido até então, que era bater um papo breve e inteligível com um dos robôs que estava vigiando a área.

Foi um feito extraordinário.

- Acho que tem uma boa matéria aí - confidenciou o jornalista, passando um cigarro pela cerca de trama de aço -, mas eu preciso de uma perspectiva local. Fiz uma lista de perguntas prosseguiu ele, vasculhando o bolso de dentro do casaco -, e você talvez pudesse fazer com que ele, aquilo, sei lá como vocês o chamam, talvez ele pudesse dar algumas respostas rápidas. A pequena chave de catraca voadora disse que ia ver o que podia fazer a respeito e saiu, chiando.

Não houve nenhuma resposta.

No entanto, curiosamente, as perguntas no pedaço de papel batiam mais ou menos exatamente com as perguntas que estavam passando pelos maciços circuitos de padrão industrial da mente do robô. As perguntas eram:

"O que você acha de ser um robô?"

"Como você se sente, vindo do espaço sideral?" e

"Está gostando de Bournemouth?"

Na manhã seguinte, bem cedo, começaram a arrumar as coisas, e, dentro de alguns dias, estava claro que o robô se preparava para ir embora de vez.

- O que eu quero saber é: você consegue nos colocar dentro da nave? - perguntou Fenchurch para Ford.