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— E é?

— Ah, tem umas duas companhias nos seus calcanhares, especialmente a Rothwell-Gornt, mas diria que é a primeira, sim. A verdade é que não é possível que coisa alguma entre ou saia de Hong Kong, seja comida, enterrada ou fabricada sem que a Struan, a Rothwell-Gornt, as Propriedades Asiáticas, o BLACS (Banco de Londres, Cantão e Xangai), ou o Victoria Bank tenham metido a colher, de alguma forma.

— E Dunross, pessoalmente, como é?

Armstrong pensou um momento, depois disse, despreocupadamente:

— Repito, isso depende da pessoa a quem perguntar, Sr. Bartlett. Eu o conheço um pouco, socialmente... de vez em quando nos encontramos nas corridas. Já tive dois encontros oficiais com ele. É encantador, excelente no seu trabalho... suponho que "brilhante" seja a palavra certa.

— Ele e a família são donos de grande parte da Struan?

— Não sei ao certo. Duvido que alguém saiba, fora da família. Mas suas ações não são a chave para a mesa do tai-pan. Ah, não. Não na Struan. Disso estou certo. — Armstrong olhou firme nos olhos de Bartlett. — Há quem diga que Dunross é implacável e vive pronto para matar. Sei que não gostaria de tê-lo como inimigo.

Bartlett tomou a cerveja, e as ruguinhas ao redor dos olhos apareceram, num sorriso curioso.

— Às vezes, um inimigo é mais valioso do que um amigo.

— Às vezes. Espero que tenha uma estadia proveitosa. Bartlett pôs-se de pé, imediatamente.

— Obrigado. Vou acompanhá-lo. — Abriu a porta e fez Armstrong e o sargento Lee passarem, depois saiu atrás deles pela porta da cabine principal, até os degraus da escada. Inspirou fundo. Mais uma vez, notou algo de estranho no vento, nem agradável nem desagradável, nem odor nem perfume... só estranho, e curiosamente excitante. — Superintendente, que cheiro é esse? Casey também o sentiu, no momento em que Sven abriu a porta.

Armstrong hesitou. Depois sorriu.

— É o cheiro particular de Hong Kong, Sr. Bartlett. De dinheiro.

2

23h48m

— Todos os deuses são testemunhas do azar que estou tendo hoje — disse Wu Quatro Dedos, e cuspiu no tombadilho. Estava na popa de seu junco marítimo, que fora amarrado junto a um grande grupo de barcos espalhados pelo porto de Aberdeen, na costa sul da ilha de Hong Kong. A noite era quente e úmida, e ele estava jogando mah-jong com três amigos, todos velhos e castigados pelas intempéries, como ele, e todos comandantes dos próprios juncos. Mesmo assim, navegavam na frota dele, e era dele que recebiam ordens. Seu nome formal era Wu Sang Fang. Era um pescador baixo e analfabeto, com poucos dentes, e lhe faltava o polegar da mão esquerda. Seu junco era velho, maltratado e imundo. Era chefe dos Transportes Marítimos Wu, comandante das frotas, e sua bandeira, a Lótus Prateada, tremulava nos quatro mares.

Quando chegou de novo a sua vez, pegou outra das pecinhas de marfim. Lançou-lhe um olhar, e como em nada melhorava a sua mão, descartou-a ruidosamente, e cuspiu de novo. A saliva brilhava no tombadilho. Usava uma camiseta velha e esfarrapada, calças de cule pretas, como os amigos, e apostara dez mil dólares só naquela partida.

— Ayeeyah — disse Tang Bexiguento, fingindo aborrecimento, embora a peça que acabara de pegar praticamente formasse uma combinação vencedora, faltando-lhe apenas mais uma peça. O jogo era parecido com gin rummy. — Fodam-se todas as mães, exceto as nossas, se eu não ganhar!

Descartou uma peça, com um floreio.

— Foda-se a sua, se você ganhar e eu não! — disse um outro, e todos riram.

— E fodam-se aqueles demônios estrangeiros da Montanha Dourada se não chegarem hoje à noite — falou Poon Bom Tempo.

— Chegarão — disse Wu Quatro Dedos, confiante. —

Os demônios estrangeiros grudam-se aos horários. Mesmo assim, mandei o Sétimo Filho ao aeroporto, para se certificar.

Começou a apanhar uma peça do jogo, mas deteve-se e olhou por sobre o ombro, observando com ar crítico um junco de pesca que passava, os motores roncando baixinho, subindo o canal de acesso estreito e sinuoso entre os grupos de barcos, na direção da garganta do porto. Apenas as luzes de ancoragem, de bombordo e boreste, estavam acesas. Ostensivamente, o junco ia só pescar, mas aquele junco era um dos dele, e ia interceptar uma traineira tai com um carregamento de ópio. Quando viu que ele tinha passado em segurança, o homem voltou a concentrar-se no jogo. A maré agora estava baixa, mas a maioria dos grupos de barcos estava cercada por águas profundas. Da praia e dos baixios vinha o fedor de algas apodrecidas, mariscos e excremento humano.

A maior parte dos juncos e sampanas estava agora às escuras, e seus muitos ocupantes, adormecidos. Aqui e ali, viam-se uns poucos lampiões a querosene. Barcos de todos os tamanhos amarravam-se precariamente uns aos outros, aparentemente sem seguir ordem alguma, com minúsculos becos marítimos entre as aldeias flutuantes. Esses eram os lares dos povos tanka e haklo — os moradores dos barcos —, que viviam suas vidas sobre as águas, nasciam e morriam sobre as águas. Muitos desses barcos nunca abandonavam sua amarração, mas ficavam grudados uns aos outros até afundarem, se desfazerem em pedaços, irem a pique num tufão, ou pegarem fogo num dos incêndios espetaculares que freqüentemente varriam os amontoados, quando pés ou mãos descuidados derrubavam um lampião, ou deixavam cair algo inflamável nas inevitáveis fogueiras sem proteção.

— Vovô! — chamou o jovem vigia.

— O que é? — perguntou Wu.

— Ali no molhe, veja! O Sétimo Filho!

O garoto, que mal teria doze anos, apontava para a terra firme.

Wu e os outros se levantaram e olharam para a terra. O jovem chinês acabava de pagar o táxi. Usava jeans, uma camiseta limpa e tênis. O táxi havia parado junto à prancha de desembarque de um dos imensos restaurantes flutuantes amarrados aos molhes modernos, a uns cem metros de distância. Havia quatro desses restaurantes flutuantes espalhafatosos — com três, quatro ou cinco andares —, iluminadíssimos, esplendorosamente decorados em escarlate, verde e ouro, com telhados chineses acanelados, deuses, gárgulas e dragões.

— Tem bons olhos, Neto Número Três. Ótimo. Vá encontrar-se com o Sétimo Filho. — Imediatamente, o garoto saiu correndo, pisando firme nas tábuas desconjuntadas que uniam aquele junco aos demais. Quatro Dedos ficou vendo seu sétimo filho dirigir-se a um dos molhes, onde as balsas-sampanas que serviam ao porto estavam agrupadas. Quando viu que o barqueiro que mandara o havia interceptado, deu as costas para a terra e sentou-se novamente. — Vamos lá, vamos acabar o jogo — falou, carrancudo. — Esta é a minha última mão, bosta. Tenho que ir para terra logo mais.

Jogaram por um momento, comprando e descartando as peças de marfim.

— Ayeeyah! — gritou Tang Bexiguento, ao ver a peça que comprara. Largou-a sobre a mesa, com um floreio, virada para cima, e desvirou as outras treze peças que lhe davam a vitória. — Olhem, pelos deuses!

Wu e os demais olharam, boquiabertos, para a mão.

— Merda! — exclamou Wu, escarrando ruidosamente. — Danem-se todas as suas gerações, Tang Bexiguento! Que sorte!

— Mais um jogo? Vinte mil, Wu Quatro Dedos? — perguntou Tang, alegremente, convencido de que o velho demônio, Chi Kung, o deus dos jogadores, estava sentado no seu ombro.

Wu começou a sacudir a cabeça, mas naquele momento uma ave marinha passou voando e piando queixosamente.

— Quarenta — disse imediatamente, mudando de idéia, interpretando o piado como um sinal dos céus, de que sua sorte mudara. — Quarenta mil ou nada! Mas terá que ser com dados, porque agora não tenho tempo.

— Não tenho quarenta em espécie, por todos os deuses, mas com os vinte que me deve, dou meu junco como garantia amanhã, quando os bancos abrirem, e arranjo um empréstimo, e lhe dou toda a parte do meu lucro no nosso próximo carregamento de ouro ou ópio, até que você seja pago, heya?

Poon Bom Tempo falou, com azedume: