— Com arcos e flechas. Contra isso eles têm pouco a fazer. Mas são petulantes e não recuam assim tão facilmente. Se agora vêm numa superioridade numérica como essa, os arqueiros não serão capazes de nos salvar.
Nuramon voltou-se para o rei dos anões:
— Wengalf, eu presumo que vocês queiram avançar contra o inimigo em couraçado-dragão... — Sempre que uma tropa se protegia com escudos por todos os lados e por cima, os anões chamavam assim essa formação. — Vocês ainda têm as lanças que usaram naquela época contra os dragões?
— Mas é claro. O que devemos fazer?
— Detenham os cavaleiros como fizeram com Balon naquele tempo.
Wengalf sorriu.
A seguir, Nuramon dirigiu-se a Nomja:
— Os seus arqueiros vão tornar mais escassas as fileiras de cavaleiros e então Wengalf poderá se encarregar dos restantes.
— E o que nós, alvemerenses, fazemos no meio? — perguntou uma elfa chamada Daryll. Ela era a substituta de Obilee e só reconhecera Nuramon como líder com relutância.
— Os anões darão partasanas[6] a vocês — explicou Nuramon. — Providenciem que os cavaleiros inimigos as vejam. Eles evitarão vocês e se atracarão com os anões, cujas lanças só verão quando for tarde demais. — Nuramon dirigiu-se novamente a Nomja: — Vocês terão de atirar nos flancos dos cavaleiros. Nenhum deve conseguir passar.
— E o que nós faremos? — agora era Mandred que interferia. Conseguira reunir uma tropa para se juntar aos filhos dos albos.
— Você esperará escondido com os seus cavaleiros firnstaynenses na ala direita, na grande depressão. Assim que os inimigos estiverem perto o bastante, ataque pelos flancos. Conduzirei os cavaleiros alvemerenses contra a outra ala e farei o mesmo.
Nomja balançou a cabeça de forma elogiosa.
— Meus arqueiros montados o acompanharão.
Lumnuon pediu a palavra:
— Nós, da linhagem de Weldaron, defenderemos nossos parentes.
Nuramon deu um tapinha no ombro do jovem elfo.
— Nomja será um grande reforço para nós.
Wengalf voltou-se para Nuramon:
— O plano é excelente. Quando a luta irromper, avançarei passo a passo com meus guerreiros. O couraçado-dragão vai pôr os amigos para dentro, mas espetar o inimigo à frente. Vamos ao trabalho! Que o destino esteja do seu lado, Nuramon!
O rei seguiu com seus homens até o seu contingente. Só Alwerich ficou.
— Meu amigo! Não se arrisque demais na linha de frente! — advertiu ele. — Pense no que tem a perder! Aqui, um verdadeiro líder deve ter isto — disse, estendendo para Nuramon um objeto de couro, fechado com vidro nas duas pontas.
— O que é isso? — perguntou ao anão.
— Uma luneta — respondeu Alwerich. — Você precisa segurar na frente do olho. — O anão indicou o lado fechado com o vidro menor.
Nuramon fez o que o anão mandou e ficou admirado: com esse tubo ele podia ver bem de perto coisas muito distantes! Reconheceu nitidamente à sua frente o estandarte de dragão dos anões. Ao abaixar o tubo, Nuramon teve de piscar os olhos.
— Como é que, nós, elfos, ainda não chegamos a algo assim?
— É porque vocês não gostam de admitir que também há fronteiras para os sentidos de vocês — retrucou Alwerich com um sorriso. — Cuide-se!
— Obrigado, Alwerich. E você também se cuide!
Alwerich seguiu o seu rei. Estava estampada em seu rosto a preocupação que tinha com o amigo.
— Deixe-me ver! — exigiu Mandred, e Nuramon entregou o tubo a ele.
Enquanto o jarl dos firnstaynenses se ocupava da luneta, Nuramon mandou Lumnuon para o seu clã. Deviam se reunir no flanco esquerdo.
Além de Mandred, agora havia somente Nomja ao seu lado.
— Esse foi um bom conselho de guerra. As suas dúvidas são infundadas, Nuramon. Você é um bom líder. Antes de você chegar, muitos estavam com medo — Nomja confortou-o.
— Os anões com certeza não estavam com medo e os firnstaynenses não conhecem essa palavra — disse Nuramon.
— Acredite, os meus fiordlandeses conhecem o medo — reconheceu Mandred com amargor. — Mas nós vamos lutar. Os meus homens sabem que se perdermos hoje não haverá mais para onde fugir. Ou eles vencem, ou eles morrem. O plano é bom, Nuramon, e a sua fala destemida com certeza causou boa impressão nos outros líderes.
— A minha ignorância, você quer dizer.
Mandred sorriu, mas Nomja sacudiu a cabeça:
— Seja como for, os líderes transmitirão a sua confiança aos seus guerreiros.
— Você acha que podemos ganhar esta batalha? — perguntou a ela em voz baixa.
Nomja olhou para os anões.
— Wengalf me parece estar bem confiante. E eu tenho a sensação de que ele ainda esconde algumas surpresas no seu couraçado-dragão.
Mandred devolveu a luneta a Nuramon.
— Isso é mesmo uma maravilha! Será que você pode perguntar aos seus amigos anões se por acaso têm mais um desses? Com certeza dá para farejar boas caças com ele.
Nuramon riu.
— Quando a batalha terminar eu pergunto a Wengalf.
— Ótimo, meu amigo. — Mandred estendeu a mão a Nuramon para o cumprimento de guerreiros.
Nuramon agarrou o seu antebraço. A pegada de Mandred era forte.
— Mandred, eu sei que vocês, firnstaynenses, são cabeças-duras. Mas não se arrisque demais! Só precisamos detê-los por tempo suficiente. Então tudo estará ganho.
— Não vou fazer nenhuma burrice. É melhor cuidar de você mesmo! Desde a luta com o devanthar eu lhe devo a vida e, na ala direita, vou estar longe demais para ajudá-lo.
Nuramon sorriu.
— Se o seu Luth for bom para nós, vamos nos encontrar no meio dos inimigos. Lá você vai poder salvar o meu pescoço.
— Que assim seja! — disse Mandred, que montou em sua égua e saiu galopando.
Nuramon seguiu o amigo com o olhar. O jarl só tinha aquela vida. Pelo menos era o que diziam: os humanos não renasciam. Nuramon tinha medo por Mandred e temia a morte dele como a sua própria. Não sabia se ele os acompanharia até o Outro Mundo, mas não ficaria admirado se o jarl aceitasse a oferta da rainha e permanecesse com os seus ali, na Terra dos Albos.
— Venha, Nuramon! — disse Nomja. — Devemos cavalgar até os nossos homens.
Juntos caminharam até seus cavalos. Nuramon estava prestes a montar quando viu seu arco pendurado na sela de Felbion. Havia pouco, tinha observado os arqueiros estirando suas armas. Os guerreiros elfos haviam posto novas cordas em seus arcos, como se o fio fosse a vida e o arco, a própria alma imortal. Antes de cada batalha, eles costumavam repetir esse ritual, esticando uma nova corda como uma nova vida se forma ao redor da alma. Com Nuramon era diferente. Agora sua vida e sua alma eram uma só, pois ele se lembrava de tudo o que acontecera. E seu arco e sua respectiva corda haviam sido somente um sinal que lhe indicou o caminho. Então já tinham cumprido o seu papel. Nuramon refletiu um instante, e então tomou uma decisão. Apanhou o arco da sela e foi até Nomja. A elfa já estava montada.
— Aqui, Nomja, tenho um presente para você.
— O quê? — A guerreira encarou-o admirada. — Por quê?
— Pelo seu ato heroico durante a batalha marítima. E, além disso, porque a melhor atiradora é quem deve carregar este arco.
Ela aceitou a arma.
— Eu não seria tola de recusar esse presente. Obrigada.
Nuramon montou e cavalgou lado a lado com Nomja até o flanco esquerdo. Lá os guerreiros de seu clã o aguardavam. Cada um deles estava equipado com uma espada curta e outra longa. Os cavaleiros alvemerenses tinham assumido posição do lado direito deles. Carregavam lanças curtas e, além delas, estavam armados com espadas longas. Nomja aproximou-se de Nuramon pela esquerda, assim mantendo-se na borda de sua cavalaria. Nuramon pôde ver como os cavaleiros de Nomja ficaram admirados com seu novo arco. Eles tinham arcos curtos, mais fáceis de manejar sobre os cavalos, e espadas para a luta corpo a corpo.
A espera parecia não ter fim. De tempos em tempos, mensageiros vinham até Nuramon e relatavam que perto da Shalyn Falah e em outros lugares as lutas também ainda não haviam começado. Eis que, finalmente, anunciaram que o inimigo logo viria pelas colinas. O coração de Nuramon palpitou. Aquilo que sentia era medo? Será que temia que a massa de inimigos os esmagasse e que seu pequeno plano fracassasse de forma lastimável?
6
Espécie de lança antiga, com haste terminada em ponta, atravessada perpendicularmente por um ferro em forma de meia-lua. (N.T.)