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— Será possível arranjar na Terra dois quilos de tungstênio? Note que ele não me transmitiu a palavra «Terra», nem «quilo» ou «tungstênio», e, no entanto, compreendi, sem erro possível, o sentido da sua pergunta.

— Isso parece-me difícil — pensei em voz alta.

— Então estamos condenados a viver neste planeta!

E ao mesmo tempo que o pensamento recebi o choque do desespero que o invadira.

— Não me fiz compreender bem — disse eu. Um dos meus clientes, residente no Castelo da Rocha, era um antigo diretor de uma fundição e várias vezes me mostrara a sua coleção de aços especiais e metais raros. Sendo o tungstênio muito denso, era muito possível que o pequeno bloco que ele possuía pesasse dois quilos. O difícil seria convencê-lo a: desfazer-se dele Mas, na pior das hipóteses, não seria impossível, ainda que mais demorado, encontrar algures aquela porção de metal.

À medida que transmitia as minhas reflexões os rostos dos meus amigos desanuviaram-se. Prometi tratar do caso no dia seguinte e, percebendo que os perturbava no seu trabalho, voltei a partir sem nenhuma dificuldade, salvo uma lenta e potente empurradela nas costas, quando passei o círculo.

Às 9 horas fui ao Castelo da Rocha. O meu cliente estava ausente. Com o coração aos saltos, expliquei pra mulher o fim da minha visita, pretextando uma experiência importante e urgente. O bloco a que eu me referia não pesava dois quilos, mas o que estava numa das vitrinas ultrapassava esse peso Ela consentiu em me emprestar o bloco com a condição de lhe prometer que o devolveria dentro de um prazo que não ultrapassasse um mês. No final de contas, devolvi oito dias depois, como você verá, ou, melhor, devolvi um outro equivalente.

Calculando que os meus misteriosos amigos dele precisariam o mais breve possível, corri direto para a clareira do Magnou. O círculo repulsivo já não existia. Fui acolhido por Souilik, a quem entreguei o bloco. Por ter uma entrevista, ao meio-dia, com o presidente da Câmara, não pude ficar mais tempo. Ficou combinado que eu passaria o dia seguinte — o seu último dia na Terra, pensavam eles — no disco voador, pois tinham várias perguntas a fazer-me sobre o nosso planeta. Por minha parte esperava propor-lhes voltarem à Terra, mas a um local mais seguro. Pensava, nesse momento, nos planaltos dos Causses, no Saara, ou em qualquer sítio no gênero.

No decorrer do almoço distraí-me. Um dos meus empregados trouxera-me, finalmente, a almejada lebre. O presidente estava eufórico e eu tirei vantagens disso.

Cerca das 4 horas da tarde, quando nos levantávamos da mesa, bateram na porta.

Não sei porque, tive um pressentimento de que um grave aborrecimento se aproximava. Era o Bousquet, um conhecido malandro, caçador furtivo, que desejava falar ao presidente.

Surpreendido por aquele imprevisto pedido (habitualmente o Bousquet evitava cuidadosamente tudo que, de perto ou de longe, se assemelhasse a autoridade), o presidente perguntou-me se podia receber o homem em minha casa.

— Isto é rápido, e depois poderemos falar demoradamente do nosso assunto.

Concordei e o Bousquet entrou. Já conhecia o malandro, de o ter tratado uma ou duas vezes, gratuitamente. Como recompensa, ensinara-me vários locais de boa caça.

Não perdeu tempo com cumprimentos:

— Sr. Presidente, há diabos na clareira do Magnou!

Creio que empalideci. Os meus «amigos» tinham sido descobertos!

— Diabos? Que história é essa? — retorquiu o presidente, homem pouco dado a superstições.

— Sim, senhor. Diabos! Vi com meus olhos!

— Ah, sim?! E com quem se parecem os teus diabos?

— Com homens. Com homens verdes. E também havia diabas!

— Vamos ver, explique-se! Como é que você os viu?

— Pois saiba o Sr. Presidente que eu andava passeando pelo bosque, não muito longe da clareira, quando ouvi um ruído de ramos quebrados Pensando que era um porco bravo, ergui a espingarda…

— Ah! Você andava passeando com a sua espingarda? Sem licença, não é verdade?

— Eu…

— Adiante. Vamos aos diabos.

— Ergui então a minha espingarda, voltei-me e dei de cara com uma diaba.

— Veja só! e era bonita?

— Não era má… Mas tinha a pele verde. Me assustei e disparei a espingarda.

Praguejei intimamente.

— Não a atingi porque o cano estava voltado para baixo, mas ela aterrorizou-se, fez um gesto com a mão e eu caí como «Se tivesse levado uma bordoada. Depois pôs-se a correr. Levantei-me, furioso, e comecei a persegui-Ia. Ela corria que nem uma lebre. Perdi-a de vista e quando cheguei a vinte metros da clareira dei com o nariz contra o muro!

— O que? Ali não tem nenhum muro! Conheço a clareira como as minhas mãos!

— Me expliquei mal, Sr. Presidente. Sei muito bem que ali não tem muros, mas era como se tivesse. Não conseguia avançar. E os arbustos estavam curvados como se soprasse um vento forte, e, no entanto, não soprava!

Pensei na minha própria experiência e compreendi o desabafo de Bousquet.

— Não podia avançar! Espreitei através das árvores e vi uma duzia de diabos atarefados em volta de uma máquina brilhante como o fundo de uma panela.

Entravam e saiam por uma porta. Reconheci a diaba, falando a um dos outros, mas eu estava muito longe para conseguir ouvir as palavras. Então todos os diabos se voltaram para mim e riram-se! Depois caiu-me em cima uma coisa, sem que eu visse o que era, e fui rolando pelo meio dos arbustos até uns bons cem metros da clareira.

Foi isso que me afugentou. Corri até a estrada e depois vim aqui prevenir o senhor.

O presidente fitava-o com ar cético:

— Você tem certeza de que hoje não bebeu? Uma aguardentezinha ou rum?..

— Não, sr. Presidente. Apenas dois litros de tinto, ao almoço, como toda a gente.

— Hum… Que pensa disto, doutor?

Eu tentava ganhar tempo e menti sem escrúpulos:

O senhor sabe que, por muito pouco que o fígado deste homem esteja avariado, dois litros bastam. Tem reputação de beber. O delírio, a maior parte das vezes, faz com que vejam elefantes cor-de-rosa mais vulgarmente do que diabos verdes… Mas nunca se sabe…

— Bem, está bem. Dentro de uma hora vá se encontrar comigo na Câmara Municipal. Tenho assuntos mais importantes a tratar do que os teus diabos.

Bousquet saiu abanando a cabeça. O presidente disse-me então:

— Evidentemente que está bêbado, se bem que não titubeie. Diabos! Veja lá isto! É um caso para o abade e não para mim!

Concordei com um assentimento de cabeça, os pensamentos distantes. Como despachar o presidente, sem o ofender, a fim de avisar os meus «amigos»?

Na verdade, não o consegui. Tive de discutir pormenorizadamente o assunto que nos dizia respeito e ele só partiu lá para as 18 horas.

Saí imediatamente e fui a Rouffignac. Numerosos grupos, dispersos, estacionavam na praça. O Bousquet tinha espalhado o caso e o tema aumentava de minuto a minuto. Já se falava de duzentos diabos a vomitar fogo. Todavia, isso não me inquietava lá muito porque ninguém queria ir verificar os fatos no local.

Depois de Rouffignac tomei a estrada que conduzia ao bosque. Um quilômetro depois fui obrigado a travar. Com a luz dos faróis vi uns doze camponeses, que reconheci como sendo os meus companheiros habituais da caça. Todos eles traziam espingardas. Parei.

— Onde é que vocês vão? Caça ou guerra?

— Caçar o diabo, Sr. Clair!

— O quê? Vocês acreditam numa só das palavras do que disse aquele mentiroso do Bousquet? Estava com uma bebedeira quando contou a história. O presidente lhes contará o que se passou!

— Talvez sim. Mas não a Maria do Blanchard. Ela também os viu e ficou quase doida de medo. O seu colega está tratando dela.

— Ah! Ora vejam! E foi na clareira do Magnou que ela também viu os diabos?