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— Atenção!… Perigo!… gritei, sem pensar que os Hiss não compreendiam a nossa palavra articulada.

Aass também os vira, pelo que, em vez de continuarmos a descer, subimos. Os caças lançaram-se em nossa perseguição Um deles ultrapassou-nos, e tão próximo que vi perfeitamente o piloto No posto de comando Souilik manobrou febrilmente um conjunto de instrumentos.

Deixamos os caças longe, atrás de nós — pequenos pontos negros diminuindo, progressivamente, de amplitude, cada vez mais distantes. A superfície visível da Terra crescia, de momento a momento, até poder abrangê-Ia com um só olhar. O céu passou de azul a índigo e, depois, a negro. As estrelas tornaram-se visíveis.

Compreendi que deixávamos a atmosfera terrestre!

Uma meia hora depois da nossa partida a Terra era totalmente visíveclass="underline" uma enorme bola esverdeada, cheia de manchas brancas. Eu era o primeiro homem que escapava da atração terrestre!

Ficamos imóveis no Espaço enquanto durou o «conselho de guerra» que se reuniu na minha presença. Os meus companheiros nada fizeram para esconder a discussão que se desenrolava. Antes pelo contrário: Essine não deixou de me transmitir os pontos mais importantes. Resumindo: Aass opinava que se esperasse que anoitecesse para me desembarcarem; Souilik, ao invés, apoiado por Essine e por dois outros Hiss, pretendia levar-me para o planeta Ella. Parecia que o seu principal argumento era ser eu um representante do «planeta humano» mais distante que eles conheciam; por outro lado, que a regra de não estabelecer relações com os mundos onde a guerra ainda reinava só dizia respeito aos planetas galáxicos e não aos extra— galáxicos. Dava-se o caso, acrescentou ele, de a nossa humanidade não ter a menor noção do «caminho do ahun», e, portanto, Ella não corria perigo algum. Em qualquer altura eu podia regressar. E mais ainda: quem poderia negligenciar o menor apoio que fosse quando a ameaça dos Milsliks estava a menos de um milhão de anos-luz?

Quem podia, sobretudo, insistiu ele, negligenciar o apoio de uma humanidade de sangue vermelho?

Finalmente Aass voltou-se para mim e disse.

— Se você quiser poderemos lhe levar para o nosso planeta, desde que você possa ingerir os nossos alimentos, porque a viagem é longa. Vai comer conosco. Se tudo correr bem, partiremos para Ella e lhe traremos de volta mais tarde.

E foi assim que comi o meu primeiro repasto extraterreno, refeição que depressa seria seguida de muitas outras. O «disco» — ou, como direi a partir de agora, o ksill — conservava-se imóvel, a 25.000 quilômetros da Terra.

Os Hiss, salvo no caso de banquetes solenes, tomam as refeições de pé. Comemos na própria divisão onde estávamos. Os alimentos compunham-se de uma geleia rosada, de ótimo paladar, e biscoitos, que pareciam feitos com uma farinha de cereal, regados por um líquido que lembrava o hidromel. Os pratos e os talheres eram de uma matéria transparente, de azul muito lindo, inquebrável, segundo observei ao deixar cair o meu prato. Com grande alívio, verifiquei que ficara rapidamente satisfeito e digeria perfeitamente os alimentos.

Passei a tarde a olhar para a Terra, esta Terra que ia deixar para ir não sei para onde. De noite, após uma refeição idêntica, indicaram-me uma cama baixa. Apesar da minha excitação mental, a fadiga adormeceu-me.

Quando acordei estava sozinho na divisão. Ao lado ouvia um ruído contínuo. Me levantei, abri a porta e encontrei Aass. — Ia lhe acordar — transmitiu ele — Vocês, terrestres, dormem muito.

Me conduziu para o laboratório.

— Antes de prosseguir, já é tempo, creio eu, de lhe dar uma idéia das subdivisões do nosso ksill. São mais ou menos invariáveis Os ksills têm uma forma exterior de lentilha, cujo diâmetro varia de 15 a 150 metros, indo a espessura de 2 a 18 metros.

Num ksill de envergadura média, como aquele onde eu estava, e que media 30 por 3,5 metros, o centro era ocupado pelo posto de comando, ou séall, divisão hexagonal com cerca de 5 metros de lado. Em volta havia outras seis divisões, com as mesmas dimensões: dormitório, casa dos motores (havia três), etc. Ao redor destas divisões, e diminuindo progressivamente de altura para a periferia, estavam alojados os armazéns de víveres, os acumuladores de energia, os reservatórios de ar, etc. A equipagem normal de um ksill deste tipo é de doze pessoas.

No laboratório estavam reunidos — sem contar Aass — os nove sobreviventes, que assim vi todos juntos pela primeira vez. Eram cinco homens e quatro mulheres.

Contrariamente ao que acontece habitualmente quando se entra em contacto com uma raça diferente, não tive nenhuma dificuldade em distinguir os indivíduos uns dos outros. Aass era o mais avantajado, mais alto alguns centímetros do que eu. Os outros eram nitidamente mais baixos. Nenhuma das mulheres atingia 1,65 m. Já tinha contacto com dois deles, além de Aass: Souilik e Essine.

Aass fez as apresentações. Segundo o que percebi, era físico, ou, tal como me transmitiu, «estudava as fôrças». Além disso, chefiava a expedição. Souilik era o capitão e comandava o ksill.

Dois outros eram «marinheiros», se assim me posso exprimir. Os dois restantes estudavam os planetas, o que, traduzido, queria dizer astrônomos. Como já lhe disse, o médico morrera na brutal aterragem de emergência. O outro morto, especialista de astronomia estelar, perecera atingido pelos foguetões do avião americano. Das quatro mulheres, duas eram botânicas, uma psicóloga e Essine ocupava-se de antropologia comparada.

Me perguntaram em que eu trabalhava na Terra. Respondi que tinha feito estudos de medicina mas que, atualmente, «estudava a vida». Pareceram ficar muito satisfeitos com esta resposta.

Iniciaram depois uma viva discussão oral que não julgaram útil traduzirem para mim. No final dispersaram-se e fiquei sozinho no laboratório com Aass e Souilik. Aass pediu-me que me sentasse e depois transmitiu-me:

— Decidimos levar você para o nosso planeta. Não me pergunte a que distância está da Terra. Nada poderei lhe dizer. Em breve compreenderá porquê. O mundo de vocês está no mesmo universo que o nosso — o mesmo universo no sentido lato do termo —, porque, se assim não fosse, não nos teria sido possível o nosso encontro.

Vamos iniciar a viagem de regresso. Quando chegarmos a Ella os Sábios decidirão qual a sua sorte. Na pior das hipóteses, farão você regressar para a Terra.

Somente há duzentos e quarenta émis que exploramos o «Grande Espaço» (um émis corresponde a dois anos e meio terrestres). Já conhecemos centenas de mundos onde vivem humanidades mais ou menos semelhantes a da Terra, mas é a primeira vez que encontramos um planeta onde o sangue dos homens é vermelho.

Você constitui, portanto, material de estudo e é só por essa razão que lhe levaremos para Ella, apesar da lei de exclusão.

Agora, que já estamos suficientemente afastados da Tserr, vamos passar para o ahun. Não se assuste com nada, mas não toque em nenhum aparelho Segundo o que verificamos no aparelho que nos atacou, vocês ainda usam motores químicos.

Por isso não poderá compreender os nossos.

— Também temos motores físicos — disse eu. — Mas o que é o ahun?

— É o «Não-Espaço», que rodeia o Espaço e o separa dos universos negativos. É, também, o «Não-Tempo». No ahun não existem distâncias nem tempo. Eis a razão por que não posso lhe dizer a que distância se encontra Ella da Terra, embora saibamos que está a mais de um milhão de anos-luz.

— Mas ainda há pouco me dizia que a Terra é o planeta mais longínquo que vocês conhecem!

Aass contraiu os lábios, o que nele, segundo mais tarde soube, era um indício de perplexidade.