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A metade saliente que ficou das letras agora parece dizer — na língua local — "Vá lamber sabão", e não está mais iluminada, a não ser em ocasiões especiais.

Arthur jogou fora a sexta xícara do líquido.

— Escuta, máquina — disse ele —, você diz que pode sintetizar qualquer bebida no universo, então por que fica me dando sempre essa coisa imbebível?

— Processamento de informação de paladar e nutrição — balbuciou a máquina. — Sirva-se e aproveite.

— O gosto é nojento.

— Se você gostou de experimentar essa bebida — prosseguiu a máquina — por que não compartilha esse prazer com os amigos?

— Porque — disse Arthur, mordaz — quero que continuem meus amigos. Tente entender o que eu estou tentando dizer. Essa bebida...

— Essa bebida — disse docemente a máquina — foi confeccionada individualmente para satisfazer suas necessidades pessoais de sabor e nutrição.

— Ah — disse Arthur — quer dizer que eu sou um masoquista de dieta?

— Sirva-se e aproveite.

— Ah, cala a boca.

— Está satisfeito? Arthur decidiu desistir.

— Estou — respondeu.

Aí ele resolveu que não ia desistir não, de jeito nenhum.

— Não — disse ele. — Olha, é muito simples, muito mesmo... tudo o que eu quero... é uma xícara de chá. Você vai fazer isso para mim. Fique quieta e escute.

Ele se sentou. Falou à Nutrimática sobre a índia, falou sobre a China, falou sobre o Ceilão. Falou de folhas estendidas secando ao sol. Falou de bules de prata. Falou dos gramados nas tardes de domingo. Falou de como se coloca o leite antes do chá para não talhar. Falou até (brevemente) sobre a história da Companhia das índias Orientais.

— Então é isso? — disse a Nutrimática quando ele terminou de falar.

— É — disse Arthur —, é isso que eu quero.

— Você quer o sabor de folhas secas fervidas em água?

— Bom, é. Com leite.

— Esguichado de uma vaca?

— De certo modo, é uma maneira de dizer, eu acho...

— Vou precisar de uma mãozinha para isso — disse a máquina sucintamente. Aquele balbucio animado tinha desaparecido de seu tom de voz, e ela falava de trabalho agora.

— No que eu puder ajudar... — disse Arthur.

— Você já fez o bastante — informou-lhe a Nutrimática.

Ela convocou o computador da espaçonave.

— Oi, gente! — disse o computador da espaçonave. A Nutrimática explicou ao computador da espaçonave a respeito do chá. O computador hesitou e então juntou seus circuitos lógicos aos da Nutrimática e juntos penetraram num silêncio severo.

Arthur ficou observando, à espera de alguma coisa por alguns instantes, mas nada mais aconteceu.

Deu uma pancada na máquina, e nada.

A uma certa altura desistiu e subiu à ponte de comando.

Nas imensidões vazias do espaço, a nave Coração de Ouro flutuava estacionária. A seu redor ardiam os bilhões de pontinhos luminosos da Galáxia. Em sua direção arrastava-se a horrenda massa amarela da nave vogon.

CAPITULO 3

— Alguém tem uma chaleira? — perguntou Arthur entrando na ponte de comando, e instantaneamente começou a se perguntar por que Trillian estava gritando com o computador para falar com ela, Ford estava espancando-o e Zaphod dando chutes, e também por que havia uma protuberância amarela asquerosa no visor.

Largou a xícara vazia que estava carregando e foi falar com eles.

— Olá — disse.

Nesse momento Zaphod arremessou-se sobre a superfície de mármore que continha os instrumentos que controlavam o motor convencional a fótons. Eles materializaram-se em suas mãos e ele virou a alavanca para controle manual. Empurrou, puxou, apertou e gritou impropérios. O motor a fótons deu uma sacudida fraca e morreu de novo.

— Algum problema? — disse Arthur.

— Ei! Ouviram essa? — resmungou Zaphod ao mesmo tempo que corria para os controles manuais do motor a Improbabilidade Infinita. — O macaco falou!

O motor a Improbabilidade zuniu duas vezes e também morreu.

Um

acontecimento,

cara

disse

Zaphod,

chutando

o

motor

a

Improbabilidade. — Um macaco que fala!

— Se você está chateado com alguma coisa... — disse Arthur.

— Vogons! — gritou Ford. — Estamos sendo atacados!

Arthur estremeceu.

— E o que a gente está esperando? Vamos dar o fora daqui!

— Não dá. O computador enguiçou.

— Enguiçou?

— Está dizendo que todos os circuitos estão ocupados. Não há energia em nenhum ponto da nave.

Ford afastou-se do terminal do computador, enxugou a testa com a manga da camisa e recostou-se contra a parede.

— Nada que a gente possa fazer — disse. Olhou para o nada e mordeu os lábios.

Quando Arthur era garoto, na escola, muito antes de a Terra ser destruída, ele costumava jogar futebol. Não era bom nisso de jeito nenhum, e sua especialidade era marcar gols contra em partidas importantes. Sempre que isso acontecia, experimentava a peculiar sensação de um formigamento ao redor da nuca, que subia lentamente pelas faces, até atingir-lhe o cenho. A imagem de terra e grama e um monte de garotinhos zombeteiros pulando para cima dele veio-lhe vívida à cabeça nesse momento.

Uma peculiar sensação de formigamento ao redor da nuca subiu lentamente pelas faces até atingir-lhe o cenho.

Começou a falar, e parou.

Começou a falar de novo, e parou de novo.

Por fim conseguiu falar.

— Ahn — disse ele. Limpou a garganta.

— Diga-me — prosseguiu, tão nervoso que todos os outros voltaram-se e se puseram a observá-lo. Ele deu uma olhada para a bolha amarela que se aproximava no visor.

— Diga-me — disse mais uma vez. — O computador chegou a dizer o que o estava mantendo ocupado? Estou perguntando só por perguntar... Zaphod estendeu uma das mãos e segurou Arthur pela nuca.

— O que foi que você fez, homem-macaco? — perguntou, ofegante.

— Bom — disse Arthur —, nada, na verdade. É só que agora há pouco eu estava tentando dar um jeito de conseguir. ..

— O quê?

— Fazer um chá.

— É isso aí, pessoal — disse o computador de repente. — Estou lutando com esse problema agora mesmo, e, puxa vida, é dos grandes! Falo com vocês mais tarde, — Mergulhou novamente num silêncio que só era igualado em intensidade pelo silêncio das três pessoas que olhavam para Arthur Dent. Como que para aliviar a tensão, os vogons escolheram esse momento para começar a atirar.

A nave sacolejava e retumbava. Do lado de fora, o campo de força de uma polegada de grossura que a envolvia encheu-se de bolhas, estalou e trincou sob o bombardeio de uma dúzia de Canhões Fotrazônicos Morte-Certa de 30

megalesões, e não parecia que ia agüentar por muito tempo. Quatro minutos foi quanto Ford Prefect avaliou.

— Três minutos e cinqüenta segundos — disse ele pouco depois.

— Quarenta-e-cinco segundos — acrescentou, na hora apropriada. Mexeu em vão em alguns botões inúteis, e dirigiu um olhar hostil a Arthur.