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Continuou sentado, fumando o cachimbo, irritado consigo mesmo. Tarde demais, pensou. Mas darei um jeito de compensá-la. Vou surpreendê-la neste verão com uma viagem a Paris e Londres. Talvez até a leve à Romênia. Teremos uma verdadeira lua-de-mel.

O Junction City Country Club é um prédio de calcário com três andares, em meio a colinas viçosas. Tem um campo de golfe com dezoito buracos, duas quadras de tênis, uma piscina, um bar e um restaurante, com uma lareira grande numa extremidade, um salão de jogos em cima e vestiários embaixo.

O pai de Edward fora sócio do clube, assim como o pai de Mary, e os dois freqüentavam-no desde crianças. A cidade era uma comunidade fechada, e o clube era seu símbolo.

Já era tarde quando Edward e Mary chegaram, e restavam apenas umas poucas pessoas no restaurante. Todas olharam e ficaram observando Mary sentar, sussurrando comentários umas para as outras. Mary já estava se acostumando a isso. Edward fitou-a e indagou:

— Algum arrependimento?

Claro que havia, mas eram castelos de areia, sonhos encantadores e impossíveis, como todo mundo tem. Se eu tivesse nascido uma princesa; se eu fosse uma milionária; se eu recebesse o Prêmio Nobel pela cura do câncer; se... se... se...

Mary sorriu.

— Absolutamente nenhum, querido. Já foi uma sorte que tivessem me convidado. De qualquer forma, eu nunca poderia deixar você e as crianças. — Aninhou a mão do marido entre as suas. — Não há nenhum arrependimento. Estou contente de ter recusado.

Ele se inclinou sobre a mesa e sussurrou:

— Vou fazer uma oferta que você não poderá recusar.

— Veremos — murmurou Mary, sorrindo.

No começo, logo que casaram, o ato de amor fora intenso e exigente. Possuíam uma consciente necessidade física um do outro, que só era satisfeita quando ambos ficavam completamente esgotados. A urgência abrandara com o tempo, mas as emoções ainda persistiam, constantes, ternas e satisfatórias.

Quando voltaram para casa agora, despiram-se sem pressa e foram para a cama. Edward abraçou-a e depois começou a acariciar seu corpo gentilmente, brincando com os seios, apertando os mamilos com os dedos, descendo a mão para a maciez aveludada. Mary gemeu de prazer.

— É maravilhoso...

Ela ficou por cima e começou a lamber-lhe o corpo, sentindo-o ficar duro. Quando ambos estavam prontos, fizeram amor até se sentirem exaustos. Edward abraçou a esposa, sussurrando:

— Eu a amo tanto, Mary...

— E eu amo você duas vezes mais. Boa noite, querido.

Às três horas da madrugada o telefone explodiu. Edward, sonolento, tirou o fone do gancho e aproximou-o do ouvido.

— Alô?

Uma voz de mulher disse, em tom de urgência:

— Doutor Ashley?

— Sou eu mesmo.

— Pete Grimes está tendo um ataque do coração. Sente dores horríveis. Acho que está morrendo. Não sei o que fazer.

Edward sentou na cama, tentando dissipar o sono.

— Não faça nada. Procure mantê-lo quieto. Estarei aí dentro de meia hora.

Desligou, saiu da cama e começou a se vestir.

— Edward...

Ele olhou para Mary, que estava com os olhos entreabertos.

— O que aconteceu?

— Está tudo bem. Volte a dormir.

— Acorde-me quando você voltar — murmurou Mary. — Acho que vou me sentir sensual de novo.

Edward sorriu.

— Voltarei o mais depressa possível.

Cinco minutos depois ele estava a caminho da fazenda dos Grimes.

Desceu a colina pela Old Milford Road, na direção da J Hill Road. Era uma madrugada gelada, o vento de noroeste baixando a temperatura para o negativo. Edward ligou o aquecedor do carro. Enquanto guiava, pensou se não deveria ter pedido uma ambulância antes de sair de casa. Os dois últimos "ataques de coração" de Pete Grimes haviam se revelado úlceras perfuradas. Não. Era melhor verificar primeiro.

Entrou com o carro na rota 18, a estrada de duas pistas que passava por Junction City. A cidade estava adormecida, as casas abrigadas contra o vento frio e penetrante.

Ao chegar ao final da rua 6, Edward fez a volta para pegar a rota 57 e seguiu para a Grandview Plaza. Quantas vezes já passara por aquelas estradas nos dias quentes de verão, sentindo no ar o cheiro do milho e do feno da pradaria, passando por miniaturas de florestas com choupos, cedros e oliveiras russas, as pilhas do feno de agosto empilhadas à beira? Os campos estavam impregnados com o odor dos cedros queimados, que precisavam ser destruídos periodicamente, porque invadiam as plantações. E quantos invernos passara por aquela estrada, através de uma paisagem congelada, os cabos de transmissão de energia delicadamente rendados de gelo, a fumaça solitária de chaminés distantes? Havia uma sensação inebriante de isolamento, no casulo da escuridão da madrugada, observando os campos e árvores passarem em silêncio.

Edward guiava o mais depressa possível, tomando cuidado com a estrada traiçoeira sob as rodas. Pensou em Mary deitada na cama quente, à sua espera. Acorde-me quando eu voltar. Acho que vou me sentir sensual outra vez.

Ele tinha muita sorte. Farei tudo para compensá-la, prometeu a sí mesmo. Eu lhe darei a melhor lua-de-mel que uma mulher já teve.

À frente, no cruzamento das rodovias 57 e 77, havia um sinal vermelho. No instante em que Edward se aproximou do cruzamento, um caminhão surgiu do nada. Ele ouviu um rugido súbito e o carro ficou imprensado entre dois faróis brilhantes que corriam em sua direção. Teve um vislumbre do gigantesco caminhão de cinco toneladas do exército e o último som que ouviu foi o grito de sua própria voz.

Os sinos da igreja de Neuilly repicaram pelo ar tranqüilo do meio-dia. Os gendarmes que guardavam a villa de Marin Groza não tinham motivos para prestar qualquer atenção ao empoeirado sedã Renault que passava. Angel guiava devagar, mas não o suficiente para despertar suspeitas, observando tudo. Dois guardas na frente, um muro alto, provavelmente eletrificado, e lá dentro, com toda certeza, a habitual parafernália de fachos, sensores e alarmes. Seria preciso um exército para tomar a villa. Mas eu não preciso de um exército, pensou Angel. Só do meu gênio. Marin Groza já é um homem morto. Ah, seria ótimo se minha mãe estivesse viva para ver como enriqueci. Isso a deixaria muito feliz.

Na Argentina, as famílias pobres eram realmente pobres, e a mãe de Angel fora uma dos infelizes descamisados. Ninguém sabia ou se importava com quem fora o pai. Ao longo dos anos, Angel observara amigos e parentes morrerem de fome e doença. A morte era um modo de vida, e Angel pensou, filosófico: Já que vai acontecer de qualquer maneira, por que não aproveitar para lucrar alguma coisa? No começo, houvera os que duvidavam dos talentos letais de Angel, mas os que tentavam se opor a ele tinham o hábito de desaparecer. À reputação de Angel como assassino profissional fora aumentando. Nunca fracassei, pensou Angel. Sou Angel. O Anjo da Morte.

9

A estrada coberta de neve do Kansas estava cheia de veículos, com luzes vermelhas faiscantes imprimindo uma cor de sangue ao ar gelado. Um caminhão de bombeiros, ambulância, reboque, quatro carros da patrulha rodoviária, o carro do xerife e, no centro, iluminado pelos faróis, o caminhão militar M871, de cinco toneladas, e parcialmente por baixo o carro esmagado de Edward Ashley. Uma dúzia de policiais e bombeiros se concentravam ao redor, balançando os braços e batendo com os pés, tentando se esquentar no frio do alvorecer. No meio da estrada, coberto por uma lona, estava um corpo. Outro carro da polícia se aproximou e parou derrapando. Mary Ashley saltou correndo. Tremia tanto que mal conseguia ficar de pé. Viu a lona e avançou em sua direção. O xerife Munster agarrou-a pelo braço.