— Não, senhor. Lamento muito se...
— Por favor, cuide para que isso não torne a acontecer.
Quando soube da notícia, Mike Slade foi à sala de Mary.
— Eu tentei avisá-la.
— Senhor Slade...
— Eles levam essas coisas muito a sério na diplomacia. Em 1661 os servidores do embaixador espanhol em Londres atacaram a carruagem do embaixador francês, mataram o postilhão, espancaram o cocheiro e estropiaram dois cavalos, só para terem certeza de que a carruagem espanhola chegaria na frente. Sugiro que mande um bilhete de desculpas.
Mary sabia que o jantar naquela noite seria amargo.
Mary sentia-se perturbada com os comentários que ouvia sobre a publicidade que ela e as crianças estavam obtendo. Saiu até uma matéria no Pravda, com uma fotografia dos três.
Fez uma ligação para Stanton Rogers, à meia-noite. Ele deveria estar chegando no escritório e atendeu no mesmo instante.
— Como está a minha embaixadora predileta?
— Estou bem, Stan. E você, como vai?
— Além de uma agenda que me ocupa 48 horas por dia, não tenho do que me queixar. Para ser franco, estou adorando cada minuto. Como está se saindo sozinha? Tem algum problema em que eu possa ajudá-la?
— Não chega a ser bem um problema. É apenas uma coisa que me deixa curiosa. — Ela hesitou, querendo formular o assunto de uma maneira que não permitisse qualquer mal-entendido. — Viu a fotografia min das crianças no Pravda da semana passada?
— Claro que vi! Está maravilhosa! Finalmente estamos conseguindo atingi-los!
— Os outros embaixadores recebem tanta publicidade quanto eu, Stan?
— Francamente, não. Mas o chefe decidiu promovê-la ao máximo, Mary. Você é o nosso mostruário. O presidente Ellison era sincero ao dizer que procurava o oposto do americano feio. Encontramos você e tencionamos exibi-la. Queremos que o mundo inteiro dê uma olhada no melhor do nosso país.
— Eu... eu me sinto lisonjeada...
— Continue a fazer um bom trabalho.
Eles trocaram amenidades por mais alguns minutos e depois se despediram.
Então é o presidente quem está por trás de toda essa projeção, pensou Mary. Não é de admirar que ele tenha conseguido tanta publicidade.
O interior da Prisão Ivan Stelian era ainda mais assustador que o exterior. Os corredores eram estreitos, pintados com um cinza opaco. Havia uma verdadeira selva de celas apinhadas, com grades pretas, no primeiro andar, e outra ala por cima, patrulhadas por guardas uniformizados, armados com metralhadoras.
Um guarda levou Mary a uma pequena sala para visitantes, nos fundos do prédio.
— Ela está aí dentro. Tem dez minutos para conversar.
— Obrigada.
Mary entrou na sala e a porta foi fechada. Hannah Murphy estava sentada a uma mesa pequena e escalavrada. Tinha algemas nos pulsos e usava o uniforme da prisão. Eddie Maltz referira-se a ela como uma linda estudante de dezenove anos. Só que ela parecia ser dez anos mais velha. O rosto era pálido e encovado, os olhos estavam vermelhos e inchados, os cabelos desgrenhados.
— Oi — disse Mary. — Sou a embaixadora americana. Hannah Murphy fitou-a e desatou a chorar de maneira incontrolável. Mary abraçou-a e murmurou:
— Calma, calma. Tudo vai acabar bem.
— Não vai, não — balbuciou a moça. — Serei condenada na próxima semana. Morrerei se tiver de passar cinco anos neste lugar. Juro que morrerei.
Mary apertou-a por mais um momento.
— Muito bem, agora quero que me conte o que aconteceu.
Hannah Murphy respirou fundo e depois disse:
— Conheci aquele homem... ele era romeno... e me sentia muito solitária. Ele foi gentil comigo e... fizemos amor. Uma amiga me dera dois cigarros de marijuana. Partilhei um com ele. Fizemos amor de novo e fui dormir. Quando acordei, de manhã, ele tinha sumido, mas a polícia estava lá. E eu estava nua. Eles ficaram parados ao redor, olhando enquanto eu me vestia. E me trouxeram para este inferno. — Ela sacudiu a cabeça, desamparada. — Disseram que eu ia pegar cinco anos.
— Não se eu puder evitar.
Mary pensou no que Lucas Janklow lhe dissera quando ela estava saindo para ir à prisão: "Não há nada que possa fazer por ela, senhora embaixadora. Já tentamos antes. Uma sentença de cinco anos é o normal para estrangeiros. Se ela fosse romena, provavelmente seria condenada à prisão perpétua. "Ela olhou agora para Hannah Murphy c prometeu:
— Farei tudo o que estiver ao meu alcance para ajudá-la.
Mary examinara o registro policial oficial sobre a prisão de Hannah Murphy. Estava assinado pelo capitão Aurel Istrase, chefe da Securitate. Era sucinto e não ajudava em nada, deixando evidente a culpa da moça. Terei de encontrar outro meio, pensou Mary. Aurel Istrase. O nome lhe parecia familiar. Ela recordou o dossiê confidencial que James Stickley lhe mostrara em Washington. Havia alguma coisa ali sobre o capitão Istrase. Algo a respeito... e de repente ela se lembrou.
Mary marcou uma reunião com o capitão para a manhã seguinte.
— Está perdendo seu tempo — disse-lhe Mike Slade, bruscamente. — Istrase é uma montanha. Não pode ser demovido.
Aurel Istrase era um homem baixo e trigueiro, o rosto coberto por cicatrizes, a cabeça calva e lustrosa, dentes manchados. No início de sua carreira alguém lhe quebrara o nariz, que não fora consertado direito. Istrase teve de ir à embaixada americana para o encontro. Estava curioso sobre a nova embaixadora.
— Desejava falar comigo, senhora embaixadora?
— Desejava, sim. Obrigada por ter vindo. Quero discutir o caso de Hannah Murphy.
— Ah, sim, a traficante de tóxicos. Temos leis rigorosas na Romênia para as pessoas que vendem tóxicos. Sempre vão para a cadeia.
— Isso é ótimo — disse Mary. — Fico satisfeita por saber. Gostaria que tivéssemos leis mais rigorosas de repressão aos tóxicos nos Estados Unidos. Istrase estava aturdido.
— Então concorda comigo?
— Claro. Qualquer pessoa que vende tóxicos merece a prisão. Hannah Murphy, no entanto, não vendia tóxicos. Ela apenas ofereceu um pouco de marijuana a seu amante.
— É a mesma coisa. Se...
— Não, capitão, não é a mesma coisa. O amante era um tenente de sua força policial. Ele também fumou marijuana. Foi punido?
— Por que deveria ser? Estava apenas obtendo provas de um ato criminoso.
— Seu tenente tem esposa e três filhos9 O capitão Istrase franziu o rosto.
— Claro. A americana seduziu-o para a cama.
— Capitão, Hannah Murphy é uma estudante universitária de dezenove anos. Seu tenente tem 45 anos. Quem seduziu quem?
— A idade não tem nada a ver com isso — insistiu o capitão, obstinado.
— A esposa do tenente tem conhecimento da aventura do marido?
O capitão Istrase fitava-a fixamente.
— Por que deveria ter?
— Porque me parece um caso óbvio de cilada. Acho melhor tornarmos pública a história. A imprensa internacional ficará fascinada.
— Não haveria sentido nisso. Mary jogou seu trunfo.
— Porque o tenente é seu genro?
— Mas claro que não! — protestou o capitão, furioso. — Quero apenas que se faça justiça.
— Eu também.
Segundo o dossiê que Mary lera, o genro se especializava em entrar em contato com jovens turistas — homens e mulheres — levando-os para a cama e sugerindo lugares em que podiam negociar no mercado negro ou comprar tóxicos, denunciando-os em seguida. Mary acrescentou, em tom conciliador:
— Não há necessidade de sua filha saber como o marido se comporta. Creio que seria melhor para todas as pessoas envolvidas se discretamente soltasse Hannah Murphy e a mandasse de volta para os Estados Unidos. O que acha, capitão?