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Mary ficou observando os alunos se levantarem e se encaminharem para a porta.

— Para a senhora também, professora.

Mary Ashley adorava a troca de idéias do seminário. História e geografia adquiriam vida nas discussões acaloradas entre os jovens e brilhantes alunos. Nomes e localidades estrangeiras tornavam-se reais, os eventos históricos assumiam formas definidas. Aquele era o seu quinto ano na Universidade Estadual do Kansas, e dar aulas ainda a emocionava. Tinha cinco cursos de ciência política por ano e ainda promovia os seminários de pós-graduação, sempre versando sobre a União Soviética e os países satélites. Havia ocasiões em que ela se sentia uma fraude. Jamais estive em qualquer dos países sobre os quais dou aula, pensava ela. Nunca saí dos Estados Unidos.

Mary Ashley nascera em Junction City, assim como seus pais. A única pessoa da família que conhecera a Europa fora seu avô, que viera da pequena aldeia romena de Voronet.

Mary planejara uma viagem ao exterior quando recebesse o diploma de mestrado, mas naquele verão conheceu Edward Ashley, e a excursão pela Europa transformou-se numa lua-de-mel de três dias em Waterville, a noventa quilômetros de Junction City, onde Edward estava cuidando de um paciente cardíaco em estado crítico.

— Precisamos viajar no ano que vem — disse Mary a Edward, pouco depois do casamento. — Estou morrendo de vontade de conhecer Roma, Paris e a Romênia.

— Eu também. Está combinado. Iremos no próximo verão.

Mas no verão seguinte Beth nasceu, e Edward estava absorvido demais em seu trabalho no Hospital Comunitário de Geary. Dois anos depois nasceu Tim. Mary tirara seu Ph.D. e fora dar aulas na Universidade Estadual do Kansas... e os anos passaram. Exceto por breves viagens a Chicago, Atlanta e Denver, Mary nunca deixara o Estado do Kansas.

Um dia, ela prometia a sí mesma. Um dia...

Mary recolheu suas anotações e olhou pela janela. A geada pintara a janela com um cinza desolado. Estava começando a nevar outra vez. Vestiu o casaco forrado de couro e a echarpe vermelha de lã e seguiu para a entrada da Vattier Street, onde deixara o carro.

O campus era enorme, 315 acres com 87 prédios, inclusive laboratórios, teatros e capelas, em meio a um cenário bucólico de árvores e relva. A distância, os escuros prédios de calcário da universidade, com suas toninhas, pareciam castelos antigos, preparados para repelir as hordas inimigas. Enquanto Mary passava pelo Denison Hall, um estranho com uma câmara Nikon avançava em sua direção. Ele apontou a câmara para o prédio e disparou. Mary estava no primeiro plano da foto. Eu deveria ter saído da frente, pensou. Estraguei a fotografia.

Uma hora depois o fotógrafo estava a caminho de Washington.

Cada cidade possui o seu ritmo característico, uma vibração que deriva das pessoas e da terra. Junction City, no Condado de Geary, é uma comunidade agrícola, com 20.381 habitantes, duzentos quilômetros a oeste de Kansas City, orgulhando-se de ser o centro geográfico do território continental dos Estados Unidos. Possui um jornal — The Daily Union —, uma emissora de rádio e outra de televisão. A área comercial do centro consiste de algumas lojas dispersas e postos de gasolina pela Rua 6 e pela Washington. Há a Penney's, o First National Bank, a Domino Pizza, a Flower Jeweler's e uma Woolworth's. Há lanchonetes, uma estação rodoviária, uma loja de roupas masculinas e uma loja de bebidas — o tipo de estabelecimentos que se encontra em centenas de pequenas cidades espalhadas pelos Estados Unidos. Mas os habitantes de Junction City amam-na por sua paz e tranqüilidade bucólicas. Pelo menos durante a semana. Nos fins de semana, Junction City torna-se o centro de descanso e recreação para os soldados do Forte Riley, que fica próximo.

Mary Ashley parou para fazer compras para o jantar no Dillon's Market, a caminho de casa. Depois, seguiu para o norte, na direção da Old Milford Road, uma área residencial adorável, que dava para um lago. Carvalhos e olmos estendiam-se pelo lado esquerdo da estrada, enquanto no direito havia lindas casas, dos mais diversos tipos, de pedras, alvenaria ou madeira.

Os Ashley moravam numa casa de pedra de dois andares, no meio de colinas ondulantes. Fora comprada pelo doutor Edward Ashley e sua esposa treze anos antes. Tinha uma sala de estar grande, sala de jantar, biblioteca, copa e cozinha no primeiro andar, uma suíte e dois quartos no segundo.

— É grande demais para apenas duas pessoas — protestara Mary.

Edward a abraçara, murmurando:

— Quem disse que haverá apenas duas pessoas?

Quando Mary chegou em casa, Tim e Beth estavam à sua espera.

— Adivinhe o que aconteceu? — perguntou Tim. — Nossos retratos vão sair no jornal!

— Ajudem-me a guardar as compras — pediu Mary. — Que jornal?

— O homem não disse. Mas tirou fotografias nossas e disse que nos falaria depois.

Mary parou e virou-se para fitar o filho.

— O homem disse por quê?

— Não — respondeu Tim. — Mas tinha uma Nikon sensacional.

No domingo Mary comemorou — embora não fosse essa a palavra que aflorasse em sua mente — seu 35? aniversário. Edward promoveu-lhe uma festa surpresa no clube. Os vizinhos, Florence e Douglas Schiffer, e quatro outros casais estavam à sua espera. Edward ficou feliz como um garotinho pela expressão aturdida de Mary quando entrou no clube e viu a mesa festiva e a faixa de feliz aniversário. Ela não teve coragem de contar-lhe que já sabia da festa há duas semanas. Adorava Edward. E por que não? Quem não adoraria? Ele era inteligente, bonito e carinhoso. O avô e o pai haviam sido médicos e jamais ocorrera a Edward ser qualquer outra coisa. Era o melhor cirurgião de Junction City, um bom pai e um marido maravilhoso.

Ao soprar as velas do bolo de aniversário, Mary olhou para Edward no outro lado da mesa e pensou: Como uma mulher pode ter tanta sorte?

Na manhã de segunda-feira Mary acordou de ressaca. Houvera brindes com champanha na noite anterior e ela não estava acostumada a beber álcool. Teve de fazer um grande esforço para sair da cama. Aquele champanha me liquidou. Nunca mais, prometeu a sí mesma.

Desceu devagar e começou a preparar o desjejum dos filhos, cautelosa, tentando ignorar a cabeça latejando.

— O champanha é a vingança da França contra nós — resmungou Mary.

Beth entrou na copa, carregando seus livros escolares.

— Com quem está falando, mamãe?

— Comigo mesma.

— Que coisa esquisita.

— Quando você está certa, está certa. — Mary pôs uma caixa de cereal na mesa. — Comprei um cereal novo para você. Acho que vai gostar.

Beth sentou à mesa da copa e estudou o rótulo na caixa.

— Não posso comer isso. Você está tentando me matar.

— Não meta idéias estranhas na cabeça — advertiu Mary. — Quer fazer o favor de comer?

Tim, o filho de dez anos, entrou correndo na copa. Sentou-se e disse:

— Quero ovos com bacon.

— O que aconteceu com o bom-dia? — indagou Mary.

— Bom dia. Quero ovos com bacon.

— Por favor.

— Ora, mamãe, pare com isso. Estou atrasado para a escola.

— Fico contente que tenha falado nisso. A Sra. Reynolds me telefonou. Você está mal em matemática. O que tem a dizer?

— Dava para calcular.

— Isso é uma piada, Tim?

— Pessoalmente, não acho a menor graça — comentou Beth, desdenhosa.

Ele fez uma careta para a irmã.

— Se quer uma coisa engraçada, basta se olhar no espelho.