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— Já chega — disse Mary. — Tratem de se comportar. Sua dor de cabeça estava cada vez pior. Tim perguntou:

— Posso ir ao rinque de patinação depois da escola, mamãe?

— Você já está patinando em gelo fino. Volte direto para casa e trate de estudar. Como acha que vai parecer uma professora universitária ter um filho reprovado em matemática?

— Não vai ser nada demais. Você não é professora de matemática.

Costumam falar sobre a terrível idade de dois anos, pensou Mary. E o que dizer dos terríveis nove, dez, onze e doze anos?

Beth indagou:

— Tim já contou que teve a pior nota em ortografia? Ele lançou um olhar furioso para a irmã.

— Nunca ouviu falar de Mark Twain?

— O que Mark Twain tem a ver com isso? — perguntou Mary.

— Mark Twain disse que não tem o menor respeito por um homem que só sabe soletrar uma palavra da mesma forma.

Não podemos vencer, pensou Mary. Eles são mais espertos do que nós.

Ela preparara um lanche para os filhos, mas andava preocupada com Beth, que estava empenhada em alguma nova dieta maluca.

— Por favor, Beth, coma todo o seu lanche hoje.

— Só se não tiver conservantes artificiais. Não vou deixar que a ganância da indústria alimentícia arruíne a minha saúde.

O que aconteceu com os bons tempos de antigamente de comidas que faziam mal?, especulou Mary.

Tim tirou um papel solto de um dos cadernos de Beth.

— Olhe só para isto! — gritou ele. — "Querida Beth, vamos sentar juntos durante o período das aulas. Pensei em você durante todo o dia de ontem e..."

— Devolva isso! — berrou Beth. — É meu!

Ela tentou arrancar o papel da mão do irmão, mas Tim se esquivou e leu a assinatura.

— Ei, está assinado "Virgil"! Pensei que você era apaixonada pelo Arnold.

Beth pegou o bilhete.

— O que você sabe sobre o amor? — indagou a filha de doze anos de Mary. — Não passa de uma criança.

O latejar na cabeça de Mary estava se tornando insuportável.

— Crianças... dêem-me um pouco de descanso. Ela ouviu a buzina do ônibus escolar. Tim e Beth se encaminharam para a porta.

— Esperem! — chamou Mary. — Vocês ainda não acabaram de comer!

Ela os seguiu para o vestíbulo,

— Não há tempo, mamãe. Temos de ir.

— Até mais, mamãe.

— Está congelando lá fora. Ponham os casacos e cachecóis.

— Não posso — respondeu Tim. — Perdi meu cachecol.

E eles se foram. Mary sentia-se esgotada. A maternidade é viver no olho de um furacão,

Ela levantou os olhos quando Edward desceu e sentiu-se mais animada. Mesmo depois de tantos anos, pensou Mary, ele ainda é o homem mais atraente que já conheci. Fora a gentileza de Edward que primeiro despertara o seu interesse. Seus olhos eram de um cinzento suave, refletindo uma inteligência efusiva, mas podiam se transformar em chamas quando se deixava arrebatar por alguma coisa.

— Bom dia, querida.

Ele a beijou e os dois foram para a copa.

— Pode me fazer um favor, meu bem?

— Claro, querida. Qualquer coisa.

— Quero vender as crianças.

— As duas?

— As duas.

— Quando?

— Hoje.

— Quem as compraria?

— Estranhos. Eles chegaram à idade em que eu não sou capaz de fazer nada certo. Beth tornou-se maníaca pela alimentação saudável e seu filho está se tornando um ignorante de categoria internacional.

Edward comentou, com expressão pensativa:

— Talvez eles não sejam nossos filhos.

— Espero que não. Estou fazendo um mingau de aveia para você.

Ele olhou para o relógio.

— Desculpe, querida, mas não tenho tempo. Preciso entrar na sala de cirurgia dentro de meia hora. Hank Cates ficou preso numa máquina qualquer. Talvez perca alguns dedos.

— Ele não está muito velho para cuidar da fazenda?

— Não o deixe ouvi-la dizer isso.

Mary sabia que Hank Cates não pagava as contas a seu marido há três anos. Como a maioria dos fazendeiros da comunidade, ele estava sofrendo com os baixos preços agrícolas e com a atitude de indiferença da Administração do Crédito Agrícola. Muitos estavam perdendo as propriedades que haviam trabalhado durante toda a vida. Edward jamais pressionava qualquer paciente pelo pagamento e vários saldavam as contas com colheitas. Os Ashley tinham um celeiro cheio de milho, batata e trigo. Um fazendeiro propusera pagar com uma vaca, mas Mary protestara quando Edward lhe falara a respeito:

— Pelo amor de Deus, diga a ele que é por conta da casa!

Ela contemplou o marido agora e pensou de novo: Como dei sorte!

— Está bem — disse ela. — Talvez eu me decida a ficar com as crianças. Gosto muito do pai delas.

— Para dizer a verdade, eu também gosto da mãe. — Ele a abraçou. — Feliz aniversário, mais um.

— Você ainda me ama, agora que sou uma mulher mais velha?

— Gosto de mulheres mais velhas.

— Obrigada. — Mary lembrou-se subitamente de uma coisa. — Tenho de chegar em casa mais cedo hoje e preparar o jantar. É a nossa vez de receber os Schiffer.

O bridge com os vizinhos era um ritual da noite de segunda-feira. O fato de Douglas Schiffer ser médico e trabalhar com Edward no hospital os tornava ainda mais íntimos.

Mary e Edward saíram de casa juntos, inclinando a cabeça contra o vento implacável. Edward instalou-se em seu Ford Granada e ficou observando a mulher sentar ao volante de sua caminhonete.

— A estrada provavelmente está gelada — gritou ele. — Dirija com cuidado.

— Você também, querido.

Ela soprou-lhe um beijo e os dois carros se afastaram da casa, Edward seguindo para o hospital e Mary para a cidadezinha de Manhattan, onde ficava a universidade, a 25 quilômetros de distância.

Dois homens num carro estacionado a meio quarteirão da casa dos Ashley observavam a cena. Esperaram até que os dois carros sumissem.

— Vamos embora.

Foram até a casa vizinha aos Ashley. Rex Olds, que estava ao volante, ficou sentado no carro, enquanto seu companheiro subia até a porta e tocava a campainha. A porta foi aberta por uma morena atraente, de trinta e poucos anos.

— O que deseja?

— Senhora Douglas Schiffer?

— Sou eu.

O homem meteu a mão no bolso do casaco e tirou um cartão de identificação.

— Meu nome é Donald Zamlock. Trabalho na Agência de Segurança do Departamento de Estado.

— Santo Deus! Não me diga que Doug assaltou um banco!

O agente sorriu polidamente.

— Não, madame. Ou pelo menos não sabemos de nada a respeito. Eu queria apenas fazer algumas perguntas sobre sua vizinha, a senhora Ashley.

Ela fitou-o com súbita preocupação.

— Mary? O que há com ela?

— Posso entrar?

— Claro. — Florence Schiffer levou-o para a sala de estar. — Sente-se, por favor. Aceita um café?

— Não, obrigado. Só tomarei uns poucos minutos do seu tempo.

— Por que está querendo fazer perguntas sobre Mary? Ele exibiu um sorriso tranqüilizador.

— É apenas uma verificação de rotina. Ela não é suspeita de ter feito nada de errado.

— Espero mesmo que não — declarou Florence Schiffer, indignada. — Mary Ashley é uma das melhores pessoas que já conheci. — Uma pausa, e ela acrescentou: — Já falou com ela?

— Não, senhora. A visita é confidencial e agradeceria se a mantivesse assim. Há quanto tempo conhece a senhora Ashley?

— Há cerca de treze anos. Desde o dia em que ela se mudou para a casa ao lado.

— Diria que conhece a senhora Ashley muito bem?

— Claro que sim. Mary é minha melhor amiga. Mas o que...

— Ela e o marido se dão bem?

— Depois de Doug e eu, eles formam o casal mais feliz que já conheci. — Pensou por um instante. — Retiro o que disse. Eles são de fato o casal mais feliz que conheço.

— Fui informado de que a senhora Ashley tem dois filhos. Uma garota de doze anos e um menino de dez?

— Isso mesmo. Beth e Tim.

— Diria que ela é uma boa mãe?

— Ela é uma grande mãe. Mas afinal...

— Senhora Schiffer, em sua opinião a senhora Ashley é uma pessoa emocionalmente estável?

— Claro que é.

— Ela não tem problemas emocionais que sejam do seu conhecimento?

— De jeito nenhum.

— Ela bebe?

— Não. Não gosta de álcool.

— E drogas?

— Veio à cidade errada. Não temos nenhum problema de drogas em Junction City.

— A senhora Ashley não é casada com um médico?

— É sim.

— Se ela quisesse drogas...?

— Está redondamente enganado. Ela não consome drogas. Não funga e não toma pico na veia.

O agente estudou-a por um momento.

— Parece conhecer bem a terminologia.

— Assisto Miami Vice, como todo mundo. — Florence Schiffer estava começando a se irritar. — Tem mais alguma pergunta?

— O avô de Mary Ashley nasceu na Romênia. Já ouviu-a alguma vez falar sobre a Romênia?

— De vez em quando ela relata as histórias que o avô contava sobre a velha terra. Ele nasceu na Romênia, mas veio para os Estados Unidos ainda adolescente.

— Já ouviu a senhora Ashley manifestar alguma opinião negativa sobre o atual governo da Romênia?

— Não. Ou pelo menos não me lembro.

— Só mais uma pergunta. Já ouviu a senhora Ashley ou o doutor Ashley dizerem qualquer coisa contra o governo dos Estados Unidos?

— Absolutamente não!

— Então, na sua avaliação, eles são americanos leais?

— Pode apostar que sim. Importa-se de me explicar... O homem levantou-se.

— Quero agradecer pelo tempo que me dispensou, senhora Schiffer. E gostaria de repetir que se trata de um assunto altamente confidencial. Agradeceria se não falasse a respeito com ninguém... nem mesmo com seu marido.

Um momento depois ele saía pela porta da frente. Florence Schiffer ficou parada ali, a observá-lo fixamente. E murmurou:

— Não posso acreditar que toda essa conversa tenha mesmo ocorrido...