As negociações poderiam ter durado mais, mas a sala de vapor tornara-se insuportavelmente quente.
Uma das cláusulas do contrato estabelecia que Toby não teria que estar presente aos ensaios. Um substituto ensaiaria os quadros cômicos e os números de dança com os astros convidados e ele só aparecia para o ensaio final e para a gravação. Desta maneira, Toby fazia com que seu número se mantivesse interessante e divertido.
Na tarde da estréia do show, em setembro de 1959, Toby entrou no teatro da Vine Street onde o show seria gravado e sentou-se para assistir ao ensaio. Quando terminou, tomou o lugar de seu substituto. De repente, o teatro se encheu de eletricidade. O show ganhou vida, crepitou e soltou fagulhas. E quando depois de gravado foi para o ar, naquela noite, quarenta milhões de pessoas assistiram a ele. Era como se a televisão tivesse sido inventada especialmente para Toby Temple. Em closeup, ele era ainda mais adorável, e todo mundo o queria presente na sua sala. O show foi um sucesso imediato. Saltou direto para o primeiro lugar nos índices de audiência e ali permaneceu. Toby Temple não era mais um astro.
Ele tinha se tornado um superastro.
20
Hollywood era muito mais cheia de vida e de animação do que Jill Castle jamais podia imaginar. Ela fez excursões turísticas e viu as casas de alguns artistas. Sabia que um dia teria uma casa bonita em Bel Air ou em Beverly Hills. Enquanto isso não acontecia, morava numa velha pensão, um horrendo prédio de madeira que havia sido convertido numa casa de doze cómodos, ainda mais horrenda, com quartinhos minúsculos. O quarto era barato, o que significava que ela poderia fazer render os duzentos dólares que tinha economizado. A casa ficava no bairro de Bronson, a alguns minutos de Hollywood e da Vine Street, o coração de Hollywood, e era conveniente pela proximidade dos estúdios de cinema.
Havia um outro aspecto na casa que atraía Jill. Havia uma dúzia de pensionistas, e todos eles estavam tentando trabalhar em cinema ou já trabalhavam como extras ou em papéis secundários, ou então tinham se aposentado. Os mais antigos vagueavam pela casa com robes amarelados e rolinhos nos cabelos, ternos puídos e sapatos tão arranhados que nenhum graxa daria jeito neles. Os pensionistas tinham aparência acabada, cansada, pior que a velhice. Havia um salão de uso comum , com a mobília gasta e quebrada, onde todos se reuniam durante a noite para tagarelar e falar mal da vida alheia. Todos davam conselhos a Jill, a maioria deles contraditórios.
─ Querida, a melhor maneira de conseguir um papel num filme é arranjar um AD que goste de você ─ este ela ouviu de uma senhora de rosto azedo que havia sido recentemente despedida de uma série de televisão.
─ O que é um AD? ─ perguntou Jill.
─ Um assistente de direção ─ respondeu num tom que lamentava a ignorância de Jill. ─ É quem contrata os figurantes.
Jill estava embaraçada demais para perguntar o que eram figurantes.
─ Se você quiser ouvir o meu conselho, trate de arranjar um diretor de elenco. Um AD só poderá encaixar você no filme dele. Um diretor de elenco pode encaixar você em tudo ─ disse uma velha desdentada que devia estar com cerca de oitenta anos.
─ Ah, é? A maioria deles é bicha ─ disse um ator calvo.
─ Qual é a diferença? Isto é, se dá um empurrão na gente? ─ disse um rapazinho de óculos que ansiava desesperadamente tornar-se escritor.
─ E que tal começar como extra? ─ perguntou Jill. ─ A Central de Elenco...
─ Esqueça. Os livros da Central de Elenco estão fechados. Eles nem ao menos inscrevem você, a menos que você seja uma especialidade.
─ Des... desculpe, mas o que é uma especialidade?
─ Se, por exemplo, você tiver um membro amputado. Isto paga trinta e cinco e oitenta em vez dos vinte e um e cinquenta habituais. Ou se você tem trajes a rigor, ou sabe montar um cavalo, você recebe vinte e oito e trinta e três. Se você souber manipular bem as cartas ou os dados, isto paga trinta e três e cinqüenta e oito... a mesma coisa que um membro amputado. Se você souber jogar futebol americano ou beisebol, paga vinte e oito e trinta e três. Se souber montar um camelo ou um elefante, são cinquenta e cinco e noventa e quatro. Ouça meu conselho, esqueça essa história de ser extra. Tente conseguir uma ponta.
─ Não sei muito bem qual é a diferença ─ admitiu Jill.
─ Fazendo ponta você tem pelo menos uma frase para dizer. Os extras não têm direito a falar, exceto os onipresentes.
─ Os quê?
─ Os onipresentes... os que fazem os ruídos de fundo.
─ A primeira coisa que você tem que fazer é arranjar um empresário.
─ Como arranjo um?
─ Há uma lista com os nomes de todos eles na Screen Ator. É a revista do Sindicato dos Artistas de Cinema. Tenho um exemplar no meu quarto. Vou buscar.
Todos examinaram a lista com Jill, e finalmente a limitaram a uma dúzia de empresários de menor porte. A opinião unânime era que Jill não teria nenhuma chance numa agência maior.
Armada de sua lista, Jill começou a fazer as rondas. Os seis primeiros empresários nem quiseram recebê-la. Encontrou o sétimo quando ia saindo do escritório.
─ Com licença ─ disse Jill. ─ Estou procurando um empresário.
Ele a examinou um momento e disse:
─ Deixe-me ver seu portfolio.
Ela olhou para ele sem compreender.
─ Meu quê?
─ Você deve ter acabado de descer do ônibus. Não vai conseguir nada nesta cidade sem portfolio. Trate de tirar algumas fotografias. Em poses diferentes e atraentes. Mostrando os peitos e o traseiro.
Jill arranjou um fotógrafo em Culver City, perto dos Estúdios David Selznick, que fez seu portfolio por trinta e cinco dólares. Foi apanhar as fotografias uma semana depois e ficou muito satisfeita com elas. Estava bonita, todos os seus estados de espírito haviam sido capturados pela câmara. Estava pensativa... zangada... apaixonada... sexy. O fotografo havia reunido as fotos num livro, intercaladas com páginas de celofane.
─ Aqui na frente ─ explicou ─ você relaciona os trabalhos que já fez, a sua experiência.
Experiência profissional. Aquele era o próximo passo.
Ao fim das duas semanas que se seguiram, Jill já tinha visto ou tentado ver todos os empresários de sua lista. Nenhum estava nem remotamente interessado. Um deles lhe disse:
─ Você esteve aqui ontem, querida.
Ela sacudiu a cabeça.
─ Não, não estive.
─ Bem, ela era igualzinha a você. Este é que é o problema. Vocês são todas parecidas com Elizabeth Taylor ou com Lana Turner ou com Ava Gardner. Se estivesse em qualquer outra cidade, tentando arranjar outro tipo de emprego, logo contratariam você. É bonita, atraente e tem um belo corpo. Mas, em Hollywood, a beleza é como remédio à venda nas farmácias. Moças bonitas vêm para cá de todas as partes do mundo. Fizeram o papel principal na peça da escola secundária ou ganharam um concurso de beleza ou os namorados disseram que deveriam estar fazendo cinema... e pimba! Cá estão elas aos milhares, e são todas a mesma garota. Acredite-me, querida, você esteve aqui ontem.
Os pensionistas ajudaram Jill a fazer uma outra lista de empresários. Os escritórios eram menores, localizados nos bairros de aluguéis mais baratos, mas os resultados foram os mesmos.
─ Volte quando tiver alguma experiência, menina. Você tem estampa, e no que me diz respeito poderia ser o maior acontecimento desde a descoberta de Garbo, mas não posso perder o meu tempo tentando descobrir. Trate de arranjar alguma experiência na tela e serei seu empresário.