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─ É claro ─ disse. Estou certa de que ele apreciará isso. ─ Virou-se para a figura na cama. ─ Não é mesmo, Sr. Temple? ─ E acrescentou, dirigindo-se a Jilclass="underline" ─ Vou até a cozinha preparar uma boa xícara de chá para mim.

─ Não. Seu turno termina dentro de meia hora. Pode sair agora.

Ficarei com ele até a enfermeira Gordon chegar.

Jill lançou-lhe um sorriso rápido e reconfortante.

─ Não se preocupe. Ficarei aqui com ele.

─ Acho que poderia fazer algumas compras e...

─ Ótimo ─ falou Jill. ─ Pode ir.

Ficou ali parada, imóvel, até ouvir bater a porta da frente e depois o som do carro da enfermeira que se afastava. Quando o ruído do motor desapareceu no ar do verão, Jill voltou-se para Toby.

Seus olhos estavam fixos no rosto dela, sem oscilar, sem piscar. Obrigando-se a se aproximar da cama, Jill afastou as cobertas e olhou para o corpo consumido e paralisado, para as pernas flácidas e inúteis.

A cadeira de rodas estava num canto. Trouxe-a para perto da cama e colocou-a de maneira a permitir-lhe passar Toby da cama para a cadeira. Estendeu as mãos para ele e parou. O rosto contorcido e mudificado estava a centímetros de distância, a boca num sorriso idiota, os brilhantes olhos azuis lançando malevolência. Jill inclinou-se e levantou-o nos braços. Ele pesava pouquíssimo, mas em condições de exaustão mal conseguiu erguê-lo. Ao tocar em seu corpo, sentiu o ar frio começando a envolvê-la. A pressão em sua cabeça tornava-se insuportável. Brilhantes pontos coloridos luziam diante de seus olhos, numa dança cada vez mais rápida, fazendo-a entontecer. Sentiu que ia desmaiar, mas sabia que não podia deixar que isso acontecesse. Não, se quisesse viver. Num esforço sobre-humano, arrastou o corpo inerte para a cadeira de rodas e prendeu-o com as correias. Olhou para o relógio: restavam-lhe apenas vinte minutos.

Jill levou cinco minutos para ir até seu quarto, vestir um maiô e voltar ao quarto de Toby.

Soltou o freio da cadeira de rodas e começou a empurrá-la pelo corredor, até o elevador. Ficou atrás de Toby enquanto o elevador descia, para não ver seus olhos. Mas podia senti-los. E também a umidade do ar malévolo que começava a encher o elevador, envolvendo-a, acariciando-a, enchendo-lhe os pulmões com sua putrescência, até que começou a sufocar. Não conseguia respirar.

Caiu de joelhos, lutando para respirar, para permanecer consciente, presa ali dentro com ele. Ao sentir a escuridão do desmaio fechar-se à sua volta, a porta do elevador abriu-se e Jill arrastou-se para o sol quente, deixando-se cair ao chão, respirando profundamente, recobrando aos poucos a energia. Voltou-se para o elevador: Toby estava na cadeira de rodas, observando, esperando. Puxou depressa para fora e dirigiu-se para a piscina. O dia estava lindo, sem nuvens, quente e perfumado, com o sol cintilando na água azul e pura.

Empurrou a cadeira de rodas até a borda da extremidade mais funda da piscina e freou-a. Deu a volta até a frente da cadeira. Os olhos de Toby estavam fixos nela, alerta, espantados. Pegou a correia que o prendia à cadeira e apertou-a ao máximo, puxando-a com todas as forças que lhe restavam, sentindo-se tonta de novo com o esforço. De repente, estava terminado. Jill observou a mudança no olhar de Toby quando este compreendeu o que estava acontecendo: um pânico violento e demoníaco começou a invadi-lo.

Soltou o freio, agarrou a cadeira e começou a empurrá-la em direção à água. Toby tentava mover seus lábios paralisados, num esforço para gritar, mas não se fez qualquer som e o resultado era apavorante. Jill não conseguia encará-lo nos olhos. Não queria saber.

Empurrou a cadeira de rodas até a borda da piscina.

E a cadeira ficou presa. A pequena borda de cimento detinha sua passagem. Jill empurrou com mais força, mas ela não virava. Era como se Toby a estivesse segurando por simples força de vontade. Jill podia vê-lo lutando para se soltar, lutando pela vida. Ia soltar-se, libertar-se, agarrar-lhe o pescoço com os dedos esqueléticos... Ela ouvia seus gritos. "Não quero morrer... Não quero morrer..." e, não sabendo se era real ou efeito de sua imaginação, num ímpeto de pânico, reuniu uma súbita força e empurrou o mais que pôde o encosto da cadeira de rodas. Ela se projetou para a frente, no ar, suspensa durante o que pareceu uma eternidade, e então rolou para dentro da piscina, caindo na água com estrondo. Por muito tempo pareceu flutuar e então, lentamente, começou a afundar-se os redemoinhos da água fizeram-na girar, de modo que a última coisa que Jill viu foram os olhos de Toby condenando-a ao inferno enquanto a água se fechava sobre ele.

Ela ficou ali de pé por muito tempo, tremendo sob o sol quente do meio-dia, deixando que as forças fluíssem de volta para sua mente e seu corpo. Quando finalmente conseguiu se mover, desceu os degraus da piscina para molhar o maiô.

Em seguida voltou à casa e telefonou para a polícia.

35

A morte de Toby foi manchete nos jornais do mundo inteiro. Se ele se havia transformado em herói popular, Jill transformara-se em heroína. Centenas de milhares de palavras foram impressas a respeito deles, suas fotos apareciam em todos os jornais e revistas. Sua grande história de amor era contada e repetida, o final trágico conferindo-lhe ainda maior pungência. Cartas e telegramas de pêsames fluíram, de chefes de Estado, donas-de-casa, políticos, milionários, secretárias. O mundo sofrera uma perda: Toby partilhava o dom de seu riso com os fãs e estes ser-lhe-iam eternamente gratos. As ondas radiofônicas encheram-se de homenagens a ele e todas as redes de televisão prestaram-lhe tributo.

Jamais haveria outro Toby Temple.

O inquérito teve lugar no edifício da Corte Criminal, na Grand Avenue, no centro de Los Angeles, numa sala pequena e repleta. Havia um funcionário encarregado do interrogatório, chefiando um júri composto por seis pessoas.

A sala estava repleta até o máximo de sua capacidade. Quando Jill chegou, viu-se cercada de fotógrafos, repórteres e fãs. Usava um conjunto simples, de lã preta; estava sem maquilagem e jamais parecera tão bonita. Nos poucos dias desde a morte de Toby, ela milagrosamente florescera, recuperando sua antiga imagem. Pela primeira vez em meses, conseguia dormir profundamente e sem sonhos. Tinha um apetite voraz e as dores de cabeça haviam desaparecido. O demônio que lhe sugava a vida havia partido.

Jill falara com David todos os dias; ele quisera comparecer ao inquérito, mas ela o dissuadira. Teriam tempo bastante mais tarde.

"O resto de nossas vidas", dissera-lhe David.

Havia seis testemunhas no inquérito. As enfermeiras Gallagher, Gordon e Jonhson depuseram sobre a rotina geral do paciente e seu estado. Era a vez da enfermeira Gallagher.

─ A que horas a senhora deveria deixar o serviço na manhã em questão? ─ perguntou o encarregado do interrogatório.

─ Às dez.

─ A que horas saiu?

Hesitação.

─ Nove e meia.

─ Era costume seu, Sra. Gallagher, deixar o paciente antes do fim de seu turno?

─ Não, senhor. Foi a primeira vez.

─ Poderia explicar o que aconteceu para fazê-la sair cedo naquela manhã?

─ Foi sugestão da Sra. Temple. Ela queria ficar a sós com o marido.

─ Obrigado. É só.

A enfermeira Gallagher desceu da plataforma. "Claro que a morte de Toby Temple fora acidental", pensara ela. "Era lamentável que tivessem de sujeitar uma mulher maravilhosa como Jill Temple a semelhante provação." A enfermeira deu uma olhada para Jill e sentiu uma rápida punhalada de culpa. Lembrou-se da noite em que entrara no quarto dela e encontrara-a adormecida numa cadeira. A enfermeira havia apagado as luzes sem fazer ruído e fechara a porta para que a Sra. Temple não fosse perturbada. No corredor escuro, batera num vaso que estava sobre um pedestal e ele caíra, quebrando-se. Tinha pretendido falar a esse respeito com a Sra. Temple, mas como o vaso parecera muito caro e Jill não mencionara o fato, a enfermeira Gallagher decidira não falar nada.